PRELIMINARMENTE
FILOSOFIA E REFLEXÃO
Expressar-se-á bem a ideia de que a filosofia é procura e não posse, definindo o trabalho filosófico como um trabalho de reflexão. A reflexão é uma espécie de movimento de volta a si mesmo (re-flexão) executado pelo espírito que põe em pauta os conhecimentos que possui. A experiência da vida nos dá uma multidão de impressões e opiniões. A prática de uma especialidade, o conhecimento científico, trazem-nos outras noções mais completas e mais precisas. Todavia, por mais rica que seja a nossa experiência da vida, por mais completos que sejam nossos conhecimentos científicos ou técnicos, nada disso atua como filosofia. Ser filósofo é refletir sobre este saber, interrogar-se sobre ele, problematizá-lo. Definir a filosofia como re-flexão é ver nela um conhecimento não do primeiro grau, mas do segundo, um conhecimento do conhecimento, um saber do saber.
DENIS HUISMAN & ANDRÉ VERGEZ. Curso Moderno de Filosofia
Instrutor GuimaPara boa compreensão deste RLE - ELEMENTOS DE FILOSOFIA E CIÊNCIA ESPÍRITAS, necessário se faz breve introdução à Filosofia em geral.
Desse modo, estas NOÇÕES PRELIMINARES objetivam fornecer, de forma resumida, pontos da disciplina Filosofia que facilitarão a compreensão e o desenvolvimento deste Módulo 3 e dos demais módulos deste RLE.
Vamos lá, ao trabalho!
VISÃO GERAL DA FILOSOFIAUma visão geral bastante didática sobre a Filosofia nos é dada por RÉGIS JOLIVET, na introdução do seu Curso de Filosofia (JOLIVET, 1979, págs. 19 a 24).
Essa introdução, JOLIVET a dividiu deste modo:
- Natureza da Filosofia
- Objeto da Filosofia
- Método da Filosofia e
- Divisão da Filosofia
Vejamos cada um desses pontos.Natureza da FilosofiaNesse tópico, o autor, citando Aristóteles, diz que no homem o desejo de saber é inato, e que a curiosidade por desvendar os segredos da natureza é de todos os povos, lugares e tempos da história.
A seguir, distingue as formas do saber humano: conhecimento empírico, conhecimento científico e conhecimento filosófico.
Confira:
Objeto da FilosofiaAqui, JOLIVET explica a origem etimológica e o conceito de filosofia, que é atribuído ao grego Pitágoras, cujo povo a tinha como ciência universal.
Na Idade Média, as artes e as ciências se destacaram da Filosofia, e essa separação, hoje consumada, faz que Ciência e Filosofia, ainda que tendo o mesmo objeto formal (o mundo e o homem - objeto material), aquela se preocupe com as leis do fenômeno, esta com a natureza profunda das coisas, suas causas supremas e seus fins derradeiros.
Leia a seguir:
Observação
O primeiro sábio que utilizou a palavra "Filosofia" foi Pitágoras, no século VI a.C. Em sentido etimológico, Filosofia significa devotamento à sabedoria, isto é, interesse em acertar nos julgamentos sobre a verdade e a falsidade, sobre o bem e sobre o mal. (RUIZ, 1982, P. 109)
Método da FilosofiaJOLIVET dá nesse passo a definição de método e leciona que o método de uma ciência depende do objeto mesmo dessa ciência (no caso do objeto formal).
A seguir, define o método filosófico e dá suas características essenciais.
Confira:
Observação
Para completar o ponto acima, vejamos resumidamente as diferenças entre o conhecimento científico e o filosófico, anotadas por (RUIZ, 1982, págs. 109/110).
Confira:
Divisão da FilosofiaA divisão da Filosofia historicamente sempre foi objeto de controvérsias e os autores adotam diferentes versões, conforme variados pontos-de-vista.
JOLIVET a dividiu em 3 partes: Lógica, Filosofia especulativa e Filosofia prática.
Veja como ficou:
Observação
Alguns atribuem a Aristóteles o equívoco de ter dado à Filosofia o sentido de somatória dos conhecimentos humanos; na verdade, esses autores estão enganados, porque Aristóteles não mistura, não confunde a Filosofia com as ciências particulares, ao dizer que a Filosofia é ciência de todas as coisas pelas últimas causas, isto é, pelas causas e razões mais remotas e que, por isso mesmo, ultrapassam as possibilidades, o campo e o método das ciências particulares; a estas incumbe a investigação das causas próximas observáveis e controláveis pelos recursos do método científico ou experimental. (RUIZ, 1982, P. 109)
Não há filosofia que se possa aprender; só se pode aprender a filosofar.
KANT
"Que é filosofia? ” ─ perguntava-se Jules Lachelier no decorrer de sua aula inaugural, por ocasião de seu primeiro ano de magistério em Toulouse. E, para estupefação de seus jovens alunos, respondia: “Não sei! ”. E toda a cidade de Toulouse zombava do jovem e brilhante filósofo vindo de Paris, que nem sequer sabia o que era a disciplina que estava encarregado de ensinar a seus alunos!
A observação de Jules Lachelier tinha, entretanto, um profundo sentido. Ela significava que a filosofia não é matéria de conhecimento. Em todas as outras disciplinas temos algo que aprender (...)
[Mas] Se alguém espera da filosofia um conjunto de conhecimentos precisos e certos, bastando tão-somente adquiri-los, sua decepção será completa. (HUISMAN; VERGEZ, 1964, p. 10)
O problema da FilosofiaNos tópicos seguintes, baseado em (HÜHNE, 1987 e MARITAIN, 1981), mostra-se a importância do filosofar para todo ser humano, isto é, a imperiosa necessidade de compreender e interpretar sua existência na Terra e da formação de senso crítico e reflexivo, em face dos contextos culturais, religiosos, ideológicos e sociais em que vive.
Discute-se também a "impossibilidade" de definir Filosofia, mas toma-se a definição dada por Jacques Maritain como interessante aos objetivos deste RLE.
Vamos lá.
A mesma autora aduz (HÜHNE, 1987, p. 93):
Todavia, mesmo que o ser humano não se dê conta que está fazendo filosofia, ele faz filosofia. A. Gramsci é incisivo nesta posição, demonstrando que “todos os homens são filósofos”, porque a filosofia se encontra presente na linguagem que o ser humano adquire no mundo em que vive, às vezes de modo imperceptível. Mas ele indaga: não se deveria elaborar uma concepção própria do mundo, de modo crítico e consciente?
....................................
Assim, não tem sentido definir aprioristicamente o conteúdo da filosofia, porque tudo pode ser objeto de trabalho do pensamento crítico: a política, a ideologia, a arte, a ciência.
Observação
Filosofia não se confunde com devaneios sobre fantasias; questiona problemas reais, usa princípios racionais, procede de acordo com as leis formais do pensamento, tem método próprio, predominantemente dedutivo, nas suas colocações críticas. (RUIZ, 1982, P. 109)
Voltar
Viver e compreender
(A filosofia como) um trabalho para transformar a experiência imediatamente vivida numa experiência compreendida.
MARILENA CHAUÍ
Em O que é Filosofia, MARILENA CHAUÍ problematiza o sentido da filosofia e também desmitifica a sua usual definição: “ciência universal”, “ciência de todas as coisas” ciência dos conteúdos”.
Diz a filósofa:
(...) Seria uma tarefa absurda e pouco produtiva, para não dizer inglória e vã, tentar uma definição de Filosofia. Não porque a filosofia seja essa coisa imprecisa, flutuante, tal que tudo é filosofia e nada é filosofia, mas porque definir a Filosofia é dar a ela, de antemão, conteúdos. Se eu der, de antemão, conteúdos para a Filosofia, eu terei retirado, pelo menos na perspectiva em que eu me coloco, a própria possibilidade de fazer filosofia. Então, o problema de uma definição de Filosofia se coloca não tanto porque tudo e nada é Filosofia, mas pelo próprio tipo de atividade que caracteriza a Filosofia. (Apud HÜHNE, 1987, p. 101)
Sendo assim, qual seria, então, a utilidade da Filosofia?
A própria CHAUÍ responde:
Se abandonar a ingenuidade e os preconceitos do senso comum for útil; se não se deixar guiar pela submissão às ideias dominantes e aos poderes estabelecidos for útil; se buscar compreender a significação do mundo, da cultura, da história for útil; se conhecer o sentido das criações humanas nas artes, nas ciências e na política for útil; se dar a cada um de nós e à nossa sociedade os meios para serem conscientes de si e de suas ações numa prática que deseja a liberdade e a felicidade para todos for útil, então podemos dizer que a Filosofia é o mais útil de todos os saberes de que os seres humanos são capazes. (CHAUÍ, 2005, p. 24)
Voltar
Definição de FilosofiaEm que pesem todas essas considerações, uma boa definição de Filosofia (se é ainda é possível) para os objetivos deste nosso RLE, é a de Jacques Maritain, no seu livro Introdução Geral à Filosofia. (Agir, RJ, 1981).
Diz ele:
A Filosofia é conhecimento científico que pela luz natural da razão considera as causas primeiras ou as razões mais elevadas de todas as coisas; ou ainda: o conhecimento científico das coisas, pelas primeiras causas, na medida em que estas se referem à ordem natural.
♦ Para ver o pensamento completo do autor, clique aqui
Noções introdutórias de FilosofiaO professor Silvio Seno Chibeni, do Departamento de Filosofia - IFCH - Unicamp, espírita e articulista da revista Reformador, na qual escreve sobre a temática Espiritismo, Filosofia e Ciência, mantém um site (http://www.unicamp.br/~chibeni) com textos da Filosofia e Física, áreas nas quais é formado.
Desse site, extraímos a lição abaixo, que nos servirá neste estudo introdutório da filosofia.
Vamos lá.
Filosofia: Noções introdutórias
Embora aparentemente simples, as questões do que é e para que serve a filosofia estão entre as que mais dificuldades e divergências causam entre os filósofos. Esse mero fato, porém, já indica algo importante sobre a natureza da filosofia: o questionamento sistemático, incessante e profundo de tudo o que se afirma.
É comum caracterizar-se a filosofia como aquilo que fazem os grandes filósofos: Platão, Aristóteles, Tomás de Aquino, Descartes, Locke, Hume, Kant, entre tantos outros. Embora pareça circular, essa definição também ajuda a delinear o domínio dessa disciplina, desde, é claro, que se estudem as obras desses homens. Quando fazemos isso damo-nos conta de que existe uma ampla variação nos problemas, teses e métodos que se consideram pertinentes à filosofia.
Voltando às origens da filosofia na Grécia Antiga, notamos que, pela própria etimologia do termo, a filosofia era entendida como o amor ao saber, ou a busca da verdade. Naquela época e, em certa medida, por muitos séculos da era cristã, a filosofia englobava todos os ramos do conhecimento puro (em contraste com as artes e ofícios). Só gradualmente é que alguns deles foram se tornando autônomos, como a matemática, a astronomia, a história, a biologia, a física. Em particular, a distinção entre filosofia e ciência é bem recente, esboçando-se no início do período moderno, no século XVI, e acentuando-se nos séculos seguintes.
Hoje em dia costuma-se considerar pertencentes ao tronco principal da filosofia as disciplinas da estética, lógica, ética, epistemologia e metafísica, sendo que as duas primeiras mostram tendência à autonomização. De forma muitíssimo simplificada, pode-se dizer que a estética examina abstratamente a beleza e a feiúra; a lógica investiga o encadeamento formal das proposições; a ética estuda questões relativas ao bem e ao mal, aos direitos e deveres; a epistemologia ocupa-se do conhecimento, suas origens, fundamentos e limites, enquanto que a metafísica procura especular sobre a natureza última das coisas. Fora esses ramos fundamentais, há ainda diversos outros que resultam de suas interconexões e especializações, como por exemplo a filosofia política, a filosofia da linguagem, a filosofia da ciência, a teologia.
Uma das principais correntes filosóficas contemporâneas propõe que a filosofia não deve ser entendida como a formulação ou defesa de teses ou conjuntos de teses sobre o que quer que seja, mas simplesmente como o desenvolvimento de métodos de análise crítica e sistemática, a serem aplicados especialmente ao chamado conhecimento científico.
Nessa perspectiva, o filósofo seria alguém que tenta explicitar os conceitos, os pressupostos, a estrutura lógica e as implicações das teorias científicas, políticas, religiosas, etc. Semelhante atitude crítica — mas não de uma crítica leviana, estouvada ou interesseira — seria a essência da filosofia, o elemento comum que permearia a grande variedade de linhas filosóficas já concebidas.
Embora quando se olhe para as abstrações e sutilezas tipicamente discutidas pelos filósofos se possa concluir que a filosofia para nada serve — e não poucos filósofos concordariam com isso —, a referida proposta talvez permita encontrar, num plano seguramente afastado do das necessidades materiais cotidianas, uma finalidade útil para a filosofia: a clarificação das bases, métodos e implicações das ciências e de outras disciplinas intelectuais, contribuindo-se assim para a identificação de fundamentos falsos ou inseguros, de falácias argumentativas, de dogmas encobertos.
Ensinando, ou pelo menos convidando, o homem a refletir criticamente sobre tudo o que se afirma ou faz em todos os setores, a filosofia de alguma forma auxilia o aprimoramento de seu intelecto e, talvez, de seus sentimentos, que o diferenciam de um mero animal que come, bebe, dorme e se reproduz. (Os destaques não são do original.)
Sugestão de leitura:
RUSSELL, B. The Problems of Philosophy. Oxford, Oxford University Press, 1983. (Ver, especialmente os capítulos 14 - The limits of philosophical knowledge e 15 - The value of philosophy.)
Original: http://www.ditext.com/russell/russell.html
Tradução de Jaimir Conte: http://www.cfh.ufsc.br/~conte/russell.html
Voltar
Referências bibliográficas
HUISMAN, Denis; VERGEZ; André. Curso Moderno de Filosofia. Introdução à Filosofia das Ciências. Rio de Janeiro, Freitas Bastos, 1964
JOLIVET, Regis. Curso de Filosofia. Rio de Janeiro, Agir, 1979
MARITAIN, Jacques. Introdução Geral à Filosofia. Rio de Janeiro, Agir, 1981
HÜNE, Leda Miranda [Org.]. Metodologia científica. Caderno de textos e técnicas. Rio de Janeiro, Agir, 1987
CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. São Paulo, Ática, 2005
RUIZ, João Álvaro. Metodologia Científica. Guia para eficiência nos estudos. São Paulo, Atlas, 1982
JUPIASSU, Hilton; MARCONDES, Danilo. Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro, Zahar, 1993
MICHAELIS. Dicionário Eletrônico
ROTEIRO DE LEITURA E ESTUDO (RLE)
Módulo 3 - INTRODUÇÃO AO ESTUDO DA FILOSOFIA
O Espiritismo é, acima de tudo, uma filosofia de vida, uma concepção do universo, do homem e da vida, que deve ser integralmente compreendida pelo adepto, para que ele possa realmente viver como espírita.
HERCULANO PIRES. Os três caminhos de Hécate, Cap. 19
Finalidades deste Módulo 3♦ Efetuar a leitura/estudo do texto Filosofia Geral, de autoria de Deolindo Amorim, e de outros textos complementares, objetivando conhecer noções introdutórias de Filosofia.
Pré-requisito♦ Ter lido com atenção e/ou executado os procedimentos indicados nos módulos Apresentação, (1) Metodologia de ensino-aprendizagem) e (2) Textos para estudo deste RLE.
♦ Ter lido com atenção e esquematizado as noções introdutórias de Filosofia e de leitura e linguagem filosóficas, dadas acima (tópico: Preliminarmente)
Objetivos de ensino♦ Ao concluir todas as atividades deste Módulo 3, você será capaz de:
• conhecer definições e conceitos de Filosofia
• conhecer o conceito de Verdade
• conhecer a distinção entre Filosofia e Ciência
• conhecer os Métodos e Processos da Filosofia
• conhecer as formas de aquisição do Conhecimento
• conhecer os Critérios de aferição do Conhecimento
• conhecer uma forma de Divisão da Filosofia
• conhecer o Objeto da Filosofia
• conhecer o conceito de Causa
• conhecer a teoria fundamental do Problema do Conhecimento
• conhecer as Condições do Conhecimento
• conhecer os Critérios do Conhecimento
Atividades
♦ Proceda à leitura/estudo dos textos abaixo indicados (itens Texto-base e Textos complementares), observando as instruções do tópico Leitura e Filosofia do Módulo Apresentação deste RLE.
♦ Faça um resumo da matéria, mediante notas, esquemas, mapas mentais, como preferir, para cada tópico especificado nos Objetivos de ensino (v. acima)
♦ Faça resumos próprios de pontos relevantes do material lido/estudado: pense filosoficamente, destaque os pontos altos e baixos dos textos, liste perguntas a que o texto responde, critique as ideias, exponha seu modo de ver as coisas, levante questões para futuros estudos/discussões, anote pontos para pesquisar posteriormente
♦ Consulte glossários/dicionários para verificar conceitos ou palavras desconhecidas, e as adicione ao seu glossário pessoal de filosofia
Material de estudo
♦ Tenha à mão: textos-base, e-books, dicionários, papel, lápis e fichas de anotações e fichamento, se for adotá-las
Texto-base
♦ Texto Filosofia Geral, de Deolindo Amorim, transcrito a seguir (aqui)
Textos complementares
♦ Os Textos complementares a serem trabalhados estão discriminados logo abaixo (aqui)
Exercícios
♦ Alguns Exercícios de verificação encerram o estudo deste módulo (aqui)
Impressão do material
♦ Recomenda-se a leitura on-line do roteiro e a impressão somente do material estritamente necessário
TEXTO-BASE: Filosofia Geral (por Deolindo Amorim)Instrutor GuimaEis o texto Filosofia Geral, de Deolindo Amorim, objeto deste RLE, que nos servirá como introdução ao estudo da filosofia.
Ele foi extraído do livro Doutrina Espírita. Deolindo Amorim. Círculo Espírita da Oração, Salvador, BA, 1993.
Vamos lá.